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Um dia ou dois.

[minha fotógrafa predileta]
No silêncio de domingo, o pai espera o filho no ponto. Na esquina da avenida, a moto desafina e derrapa. Os adultos brindam seus copos, alheios ao cozinheiro que saiu mais cedo. Na padaria acordada, tremem os vidros de geléia. No próximo telefonema, tudo será combinado. No espelho da farmácia, vemos a sombra de um rosto. Um pedaço de céu esquálido acontece em um beiral sem pombos. A tinta nova do prédio seca devagar e amarela. O mendigo segura as pernas, pra não cair na calçada. Os olhos estão enxutos, mas o coração pesa desastres. Há armas debaixo das roupas naquela casa alugada. O filme foi feito às pressas, mas trouxe muito dinheiro. Os canos enferrujados cantam sozinhos no escuro. As plantas crescem redondas, o vestido já está engomado. Há feridos no acidente, mas não se sabe se houve mortos. O chefe se vinga, o padre semeia, o espanto esmorece. Nada parece enrugado.
Mas eu. Eu às vezes me canso - da ferocidade do mundo.

Comentários

martina disse…
ah.... adoro as fotos dela também. e amo teus textos.
vai ser um prazer fazer companhia pra eles aqui!
:D
beijos
ana elisa novais disse…
rebeca, mas que luxo!
o texto é fantástico, adorei!
muito obrigada por essa fina gentileza, adorei...

beijos grandes,
ana
Daniel disse…
também gostei bem do que vi por aqui..
seguimos juntos então!

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