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Mostrando postagens de agosto, 2007

Quase comestível

Não, eu não gosto de cozinhar. No entanto, acho comovente quando os círculos perfeitos e transparentes das cebolas, antes tão acidamente cantantes, são mergulhados no caldo espesso e orgulhoso do azeite, para se bronzear e adormecer no fundo escuro das frigideiras. Adoro o cheiro úmido da hortelã, o violáceo impertinente das beterrabas, a madeira antiga das colheres de pau, mexendo insistentemente as abóboras cor de manhã. É comovente também o amolecimento vagaroso, mas inexorável, das raízes mais duras e das carnes mais densas sob o poder das chamas. O fogo, enfim, ainda que mecânico e domesticado, ou tornado quase místico sob as pétalas simétricas de um transparente azul, é sempre inebriante comoção. No entanto, comovem-me ainda mais as vigorosas mãos das cozinheiras, ásperas dos plangentes cortes, do contato diário e fumegante com as violentas texturas da feira: a pele plástica dos tomates; a secura terrosa e vibrante das batatas; o desfolhamento seco e pardo das cebolas; a doçura