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Mostrando postagens de 2009
O que se diz do novo A renovada forma O que se diz de novo A renomada espera Um ano Outro ano O tempo Como um golpe que escapa Sem ferir coisa alguma Como um silêncio esmiuçado Por mãos vazias E tenras O que se diz de novo e de novo Atrás dos sorrisos ansiosos Sejamos felizes Apesar de E para sempre Sejamos felizes: a vida é curta E grossa Guarda em segredo novos rituais Onde se diga de novo O que nunca devera ser Velho

Dynamis

O espaço vazio abre-se para o movimento que desvenda a altura, que permite o salto, que alcança a queda. ... O movimento, o salto e a queda tornam possível o silêncio do encontro com o espaço vazio. E suas suposições.

Imóveis em luto

Então me lembro das senhoras mortas do meu andar. Duas, pra ser mais exata. Duas mulheres que nunca conheci, a não ser de vista. Encontros no elevador e no hall do prédio. Diálogos interrompidos pela chegada ao andar certo. Seu caminhar arrastado, denunciando outros tempos. Outras histórias. Interrompidas ou terminadas? Apenas histórias. Meu andar agora está quase vazio. Dois apartamentos estão decerto tristes, ou pelo menos saudosos de suas donas, esvaziados de um cuidado e de uma doçura que os plangia e afinava. Agora, devem estar quase tão mortos quanto elas. Duros e graves. Saciados de uma rotina material e física que sua fixidez reforma continuamente. Todos os dias. Espaços solidamente antiquados, cuja altivez é menos incansável do que ridícula. Imagino-os vencidos, observando o tempo que passa. Acompanhando o degradar inóspito das paredes escuras. O cheiro sufocado dos objetos que não têm mais serventia. Eles se desenham no meu espírito, continuadamente. Quando chego em casa.

Física

Se uma gota de água desce lentamente uma superfície vertical, perdendo, no caminho, boa parte de sua matéria, velocidade e força de queda, fica, por isso mesmo, intangivelmente sutil e cada vez mais rarefeita, a menos que uma outra gota a ela se mescle, assim permitindo que ambas percorram uma distância um pouco maior.

Coragem grande...

Para Elisa É poder achar brilhando nas coisas o que nelas é secreta vertigem. Tão secreta que às vezes rudemente se mostra. Escancarada e quase triste. Como várias vezes a verdade. É andar com os olhos um pouco além dos espelhos, para além de classe ou muro, para o lado expulso da cena. Ou da festa. É pulsar à beira das coisas, no avesso coreográfico de cada dia, buscando o inalcançável sim. E o resistente não. É dizer sim ao não e não ao sim. Se necessário for. É recusar o projeto coletivo de manter os olhos fechados. E abri-los. E abri-los de novo. Os olhos. E ainda mais. E ficar boquiaberto, porque, afinal... O mundo estava lá o tempo todo. Inapelavelmente bonito . E vivo.

Gangorra

Das duas, uma. Ou tinha coragem, ou não tinha coragem. Mas as coisas não eram bem assim. Porque no fundo mesmo da maior coragem havia uma coisa talvez maior, ou menor, e a que normalmente se chamava de não-saber. Não saber participava do medo, mas participava da coragem também. Ah, porque se soubesse tudo, podia a coragem diminuir, e até completamente acabar. Ou de repente, ficar ainda maior. Mas nunca se sabia. Nunca se sabia o que verdadeiramente ia acontecer, uma vez que se fizesse – o quê? aquilo que se estava reunindo coragem pra fazer. Isso era o que dava o maior medo. Mas isso era o que também permitia ir. De olhos fechados, ir. No escuro mais escuro, ir. Morrendo de medo e de coragem, ir. Podia-se imaginar, tentar prever, tentar abarcar todas as possíveis possibilidades e hipóteses, mas ainda assim, não se sabia. Não se sabia a fundo e a tempo. Não se sabia, mas ia-se. Ia-se para a frente. Para o futuro. Para o não saber. Para aquele instante tão vulgar e tão milagros

Na piscina

Ela sempre vivera dentro dágua. Por isso acabou reconhecendo que seus líquidos sobressaltos, além de mais tortuosos, eram sedutoramente infiéis. E quase mortais. ... Foi assim, primeiro a mãe a matriculou numa escola de natação. Depois, ela aprendeu a viver daquilo: a respirar dentro da piscina como se fosse peixe. A pular entre as raias com estrondo e fúria. A domesticar o ar do fôlego e a vibrar braçadas ritmadas, plásticas, seguras. E rápidas. Muito rápidas. Ela ficou então. Quase uma atleta. Rápida e profunda. Mergulhadora dos espaços sempre azuis das águas. Piscina e mar. E rio, de vez em quando. Mas rio é mais perigoso, dizia a mãe, que quase se afogara quando era criança. E só foi salva, dizia ela, porque estava de fita vermelha no cabelo. E na correnteza em que a mãe ia, rio abaixo. Viram a fita boiando. Ela ficava admirada da história. Afinal, só existia por causa da fita. Bom, não só, mas a fita tinha sido importante. Ela é a mãe tinham sido escolhidas pra viver. Pelos acasos

Falso esquadro

Foto de Leslie Thompson Toda sorte tem seus ângulos. Alguns são um pouco macabros, outros, mais desertos. Uns podem ser esquerdos, talvez direitos, mas nem todos serão alheios a essa coisa mais grave, mais surda e mais difícil que é a falta de perspectiva.

Das ofensas nada gratuitas...

Uma das muitas formas de se criticar uma mulher é afastá-la, com maior ou menor sutileza, de tudo o que é considerado como “parte” do universo feminino – delicadeza, beleza, suavidade, elegância, candura, flexibilidade. Notem que usei apenas adjetivos “positivos”, mas ninguém desconhece o que eles representam: se é delicado, não consegue brigar; se é suave e cândido, é fácil de manipular; se é flexível, pode ser perigoso; se é belo, pode desviar a atenção de coisas mais “importantes” ou úteis, geralmente ligadas à racionalidade (posto que a beleza seria da ordem da emoção, da sensibilidade, geralmente relegadas ao plano do superficial, ou do supérfluo). São positivos, mas são negativos também. Para ofender uma mulher, costuma-se tirar dela sua “feminilidade”, chamá-la de “menos mulher”, ou de “mulher pior”, roubar dela tudo que a ela deveria se ajustar como “essência feminina”, dizer a ela, enfim, que ela falhou como fêmea. Em outras palavras, chamá-la de macho. O interessante jogo sim

Enter

Só pra indicar o ótimo projeto da Heloisa Buarque de Hollanda: http://www.oinstituto.org.br/enter/enter.html

Periférica sintaxe

Sim, há períodos marcados por um extremoso silêncio. E há ainda aqueles que, de tão lunares e pedregosos, acordam em nós vontades sem demência. Ágeis, espessas, sulfurosas. Inebriantes. Há períodos longos, longamente adjetivados, feitos de informes solfejos, de começos descalços, de vulgares tentativas de entender a morte. Ou o amor. Há períodos que são inglórios, e outros que são menores. Tanto assim. Há períodos golpeados pela sorte. Levianos, maldosos, violentos. Quase malditos. Entre uns e outros, fremem as almas. Compactas, taciturnas, docemente contidas. Entre dois pontos. De um intervalo.
Porque sua amizade é assim tão doce, merece pássaro que a provoque e suspenda, que nela fique suspenso, feito poema, que por ela voe imenso sobre os telhados. Porque sua amizade é assim tão viva, merece vôo que a comemore, leveza que a dignifique, canto que a perdure. [Para Míriam Christus]

A quem interessar possa...

Um amigo me escreveu contando de alguns " problemas literários " que ele julgava importantes... 1) A busca do Livro Absoluto Borgiano (um livro que diria tudo o que todos os outros querem dizer). O mesmo vale para o Voyage d'hiver de Perec. 2) O grande problema de shakespeare de Otelo... a traição ou não.... o mesmo também seria o problema de Machado de Assis, Capitu o traiu ou não? 3) Bataille, Clarice Lispector, Lacan e a busca do 'a'. 4) Freud e o inconsciente? 5) Kakfa e a metamorfose e o processo (o que seria a metamorfose? que culpa teria Josef K)? 6) A busca da Poesia de Drummond e Rilke.... Daí me empolguei a enumerar os meus: O PROBLEMA DO AUTOR – a “escrita”, melhor dizendo, a narrativa, a arte de contar histórias, começa coletiva, depois se “pessoaliza”, se personaliza, torna-se exclusiva de um nome. Mais recentemente, a profunda valorização desses “nomes”, dessas autorias, que foi empreendida ao longo de décadas, começa a ser questionada até sua dissol

Bougainville

Para não esquecer Irene, comprei uma semente. Espero fazê-la crescer em verdes frases. Espasmódicas e espantadas como um soluço. Ardorosas como uma veemência. Meu texto é uma porta para dentro e para trás. Por isso plantei a semente. Para talvez lembrar, mergulhar, dissolver. Meus dedos virgens ensinam, nunca se deve perfurar a terra. Ou o passado. Escrever é uma coisa crua. Talvez dilacerante, talvez cantante, mas sempre uma coisa suja, isso aprendi. A terra tem abismos desconfortáveis. Epigramáticos. Ela é feita de folhas e pedras. De mortos. A memória é feita de mortos. A página é dura e estóica, mas aos poucos me acostumei com sua terrosa ossatura. Como um deus adulto e calmo, concentro-me em mim mesma. Faço torrenciais as águas que, de tão limpas, fazem de verde as plantas. Molho a terra do vaso, onde a sedenta semente espera. Lembro que vivi um dia, úmida de cloro, amor e águas de piscina. Um traço se estabelece na página vívida e branca da narrativa. O risco invade, prenuncia,

...

O mar seu som a luz indócil de sua espuma o tom salgado de sua fosca dissolvência perturba intermitentemente desabrigados restos de areia branca

Ou então

Encontra-me, boa amiga, no final dos tempos. Lá, onde eu possa agarrá-la em definitivo. Onde tuas mãos, de novo, possam lavar as minhas. Onde teu sopro encontre minha sombra. No fim dos tempos não haverá mais fuga. Nem perspectivas. E seremos finalmente duas. Que se foram.

Da fabulosa altura assimétrica do oposto

Há coisas que a gente não nota porque são muito pequenas para serem vistas. Mas há outras que a gente não vê porque são imensas. Robert Pirsig É disso que se trata. De grandezas. De grandes e pequenos. É disso que se trata. De intensidades. De potências. De fúrias e tempestades. De atos. E de potências atuantes. De autuações. De atuações. É sempre disso que se trata. De ser maior ou menor. Ou de parecer ser. Ou de obrigar a ser. E também de transgressões. Se trata de transgressões. Ao ser maior, sendo menor. Ao dever ser pequeno, sendo grande. Se trata também de enormidades. De pequeninescências. De transgredir pelo exagero. Ou pela circunstância. De coisas que, de tão grandes, são silenciosas. E vice-versa. Sempre há vice-versas. Pra dizer de uma troca, de uma transgressão. Ou de mais do mesmo. Pra mim, sempre foi esse o problema. O problema do pequeno. Do pequeno pedindo desculpas. Por ser pequeno. Ou tendo vergonha. Ou ficando em silêncio. O tamanho como marca. Registro. Defini

Será mesmo?

Deixe isso pra depois. Não se preocupe com os muros. Não vai haver muros. A terra não tem divisões. Juan Rulfo Para sobreviver, é preciso não esquecer da culpa. Do choro, da reza, dos gafanhotos da bíblia. Que é dos personagens? Ruth, Raquel, Madalena. Estátuas de sal. Mulheres e maçãs vermelhas. Personagens são máscaras elétricas. Estertores singulares. Símbolos castrados, nuvens de gafanhotos ocultando um céu deserto. Demônios aparecem e somem. É preciso não esquecer que há palácios. É preciso não esquecer que há escadarias que levam a quartos de cartolina e crepom, onde as frutas maduras das mulheres esperam para ser colhidas a tempo. Se não, secam, apavoradas. Portanto, é preciso não esquecer que há sempre frutas maduras apodrecendo de cansaço nas árvores. Sem que ninguém as possa alcançar, sem que elas caiam. É preciso não esquecer que tudo isso está escrito no livro fétido dos homens. Livros violáceos de sangue e poder. Livros de violação. É preciso lembrar que há anêmonas urg

Um nome para Deus - Parte II

Depois, foi a vez das outras vezes. O nome de Deus sempre presente. Presente nas conversas, nas aulas, na tv, nos mistérios todos. Uma vez aparecido, começou a ouvi-lo em toda parte. Com o tempo, tomou coragem. E perguntou aos pais como fazer para conhecê-lo. E chorou contando que todas as colegas o viam sempre na escola. Menos ela. Os pais se enterneceram com a confissão ingênua. E trataram de mostrar as dificuldades de Deus. Não podia vê-lo, mas devia amá-lo. Ele era o pai de tudo. O criador de todas as coisas. Poderoso, soberano, intangível. E magnífico. As palavras novas e ainda estranhas deram ao personagem uma coloração mágica. Não parecia nada difícil amar aquele ser tão bondoso, segundo o pai, e tão misterioso, segundo a mãe (que, só muito tempo depois, confessou que duvidava de sua existência). Ele mora no céu. Diziam eles. E aquele lugar todo azul passou a dizer de uma intensidade, de uma volúpia, de uma carícia. Ele estava lá. E em todos os lugares. A mãe explicou como se re

Ops!

Cansada de dizer coisas óbvias ou coerentes, ela divagava. Detestava a coerência, que era pra ela como uma espada espantada. Passou a dizer coisas alhures. A misturar melancias com pistões. E dava mesmo muito certo. Algorítimos casavam bem com sinagogas. Suspiros, com determinações. Era mesmo assim mesmo. Ela era ovalada. De suas pernas nasciam hermenengardas, que só andavam vestidas no outono. Seus cabelos, feitos de sistemáticos motrizes, nunca eram cortados, mas diziam muito. Diziam louças e tempestades. Tramas familiares. Estigmas. Tudo por uma esmeralda. Viaturas. Cansada de dizer coisas prudentes, começou a arriscar no escuro. Nada era muito pouco. Tudo sobrava em puro susto devedor. Ela era Penélope costurante e Orfeu desatado. Nadava sempre de costas, para não encontrar a outra margem. E ganhava sempre nos jogos, disposta a modificar o circunflexo. Foi queimada dezoito vezes, e tem cicatrizes fetônias, mas não se rende. Depois de terminados os sábados, vai adoecer na chuva, par

Chuva de Letras

Esse post é só pra convidar pro lançamento de Chuva de Letras , o novo livro do Luis Alberto Brandão. Desta vez, escrito para os pimpolhos... O evento vai ser no Café com Letras, no dia 28/03, sábado, a partir das 11:00h. http://www.scipione.com.br/chuva/chuvadeletras.swf A julgar pelos dois primeiros - que me deliciaram, comoveram, seduziram e encantaram de uma forma muito particular, e quase intraduzível -, o livro novo é sem dúvida esplêndido. Vamos?

Um dia como qualquer outro?

Nesse dia das mulheres, faço questão de reproduzir aqui um texto de Marjorie Rodrigues , que resume o que eu penso sobre o assunto com muita propriedade! DISPENSO ESTA ROSA! Dia 8 de março seria um dia como qualquer outro, não fosse pela rosa e os parabéns. Toda mulher sabe como é. Ao chegar ao trabalho e dar bom dia aos colegas, algum deles vai soltar: ”parabéns”. Por alguns segundos, a gente tenta entender por que raios estamos recebendo parabéns se não é nosso aniversário (exceção, claro, à minoria que, de fato, faz aniversário neste dia). Depois de ficar com cara de bestas, num estalo a gente se lembra da data, dá um sorriso amarelo e responde “obrigada”, pensando: “mas por que eu deveria receber parabéns por ser mulher?”. Mais tarde, chega um funcionário distribuindo rosas. Novamente, sorriso amarelo e obrigada. É assim todos os anos. Quando não é no trabalho, é em alguma loja. Quando não é numa loja, é no supermercado. Todos os anos, todo 8 de março: é sempre a maldita rosa. Dize

Um nome para Deus [Parte I]

Foi quando ouviu o nome de Deus pela primeira vez. Primeiro dia de aula, escola nova, uniforme novo. Outras coleguinhas. O coração batendo grande e urgente. No meio da primeira aula, ela apareceu. Era uma moça bonita, mas vestida de um jeito esquisito. E prometeu que depois do recreio as pequeninas novatas iriam se encontrar com Deus na capela principal. Deus? A voz da moça era grave e firme. E parecia emocionada. Não podia ver seus cabelos, escondidos embaixo da touca, mas os lábios finos, suavemente expostos num sorriso, além daqueles olhos tão brilhantes, rapidamente a convenceram da importância do encontro. A simplicidade do nome a emocionava, e uma vaga lembrança de que já o havia escutado antes dava-lhe a certeza de que, finalmente, alguma coisa iria conhecer do mundo distante dos adultos. O recreio foi longo pra tanta expectativa. Com o lanche esquecido no colo, a toda hora pensava naquele nome, e no que ele tinha de lindamente simples. Deus, deus, deus, deus. Estava eufórica, e

À maneira de Ulrica

Para Silk... Sobre ela, pouco se podia dizer. Dizia-se de sua pele comovente, expansiva em forças. Explosiva ternura. Dizia-se de sua beleza. De seus girassóis. Leveza vibrátil e ardente, tocada pelo fogo, marcada por seu inexaurível mistério. Dizia-se de sua febril intensidade. Seus olhos. Ardorosa meditação sobre a alegria. Dizia-se de sua vibração aquática, humores e fluidos em infatigável doçura. Dizia-se de sua proximidade com os ventos. De sua liberdade cantante de moça do ar. Dizia-se de sua densidade terrestre. Da disposição para o encanto. Das exigências do corpo. Das pernas. Falava-se, sempre e sempre, acerca da conformação sutil de seus quatro elementos. Caleidoscópicos. Sutis neblinares de tímida e rutilante orquestração. Dizia-se que era criança e mulher. E que podia ser encantadoramente nossa em certas noites de lua cheia. Ou quando do encontro de certos tipos de amuletos. E de suspensórios. E mais não se podia dizer. Porque seria sempre muito pouco. Para saber mais sobr

De águas e vôos

Chove muito. Há muitos dias. E em quase todos eles, você esteve longe. Não posso te explicar quanto senti sua falta. Todos esses dias. Torrentes de água escoando, o muro liquefeito das esquinas, árvores ensopadas, pássaros escondidos, meus cabelos escorrendo, se desmanchando, o mundo inteiro se dissolvendo, os carros boiando sôfregos na tempestade, a noite submersa em rios, úmidas vertentes. Chove muito. Há muitos dias. E em quase todos eles, você esteve muito perto. Não posso explicar sua presença em mim, dissonante. Algo de água. Sempre fugindo. Dissolvida. Em todas as esquinas. Encharcando os sapatos, abrindo as sombrinhas, refrescando os beirais e amolecendo os telhados. Sua presença. Em mim. Na chuva. Liquefeita, esboroante, fúlgida. Tímida. O mundo inteiro encolhendo. Só sua ausência existindo. Meu coração boiando sôfrego na tempestade, contra o céu da meia-noite, te encontrando. A noite submersa em sangue, meu corpo todo pulsando, úmidas vertentes. Agora continua chovendo. Mas v